sábado, 27 de junho de 2009

Galeão 996.

Marília era como o sol.

Marília,era como o sol.

como o sol.

Ao passar pela ponte,Marília quando ia e vinha,quando partia ou chegava,quando dormia, roncava e assim despertava rapidamente,via-se,no reflexo da janela ao fim da tarde,acompanhando seus traços, ia assim pelo contorno do rosto,desdos fios no topo da cabeça,emaranhados em grampos,até a profunda e cheia linha que contornava seus seios com abundância.


Ronaldo vivia seus dias como atendente de uma loja.
Não era bem "o atendente do mês" mas sempre chegava no horário,trocava-se, e fazia o que lhe foi dito.


Luciano era lateral-esquerdo do flamengo,não tinha grana,e vivia de bicos em eventos esportivos da prefeitura de São Gonçalo.

Marília adorava acordar cedo,mas para se arrumar como sol.
Purpurinas flamejantes faziam com que seus contornos fossem destinos contagiantes.
Marília dançava com elegância.
Tinha virtudes e olhos de saudade.





Era verão de 87.
Em tantos lugares ao mesmo tempo,e o mundo em um só homem,Marília buscava em tantos sentidos uma só direção para o que lhe esperava naquela quinta-feira.
Ela havia conhecido um homem,em suas tantas idas e vidas pela cidade.
Seu nome era César,um homem de pele escura,lábios curvos em linhas finas,e dentes que quase cegavam com o sol.
-A bolsa,senhora!
Assustada ela se virou.
-A bolsa,senhora!Está aberta,cuidado.
-Com seus olhos contaminou o sorriso de César,que cegou Marília.

Na testa franzida, e no pescoço bolorento do motorista via-se uma tarde quente de 87.

Ela se reconhecia no vidro da janela do 996-Galeão.
César,já na poltrona de trás,reparou que ela se observava com esmero e atenção.
E de tanta vontade se fez ele que disfarçadamente dobrou suas mangas, passou o dedo linearmente debaixo de suas narinas e por fim após engolir um pouco de saliva disse:

-A bolsa,senhora!
Assustada ela se virou.
-A bolsa,senhora!Está aberta,cuidado.
-Com seus olhos contaminou o sorriso de César,que cegou Marília.

Marília virou-se,olhou para o aviso na frente do ônibus,pescou a conversa entre o cobrador em serviço e outro que estava sentado a frente dele e depois pensou em se virar de novo para flertar com sorriso naquela vontade.
Amanhã seria o dia D.
Dia de encontrar com César,refazer as unhas postiças,cortar as do pé e dar um jeito em sua sombrancelha que por rala,foi recompensada com uma espécie de tatuagem de produtos naturais sobre os olhos.Realmente era imperceptível.
Era noite,
Marília era como o sol sobre seu palco.
Purpurinas flamejantes
Marília dançava
e tinha virtudes.

César não viu Marília naquela noite.César se viu ardendo em paixão naquela tarde.
Marília atentou,sorriu,brilhou sobre o palco sedento de amor,mas perto do grande final,César ofegante, e asfixiado pelo delicioso delírio de estar com Mámá, a despiu.

O gosto doce do delírio,se transformou em amargo gosto de lágrimas sobre as maçãs no rosto de Silvia.

Luciano Ronaldo Sílvia Marília
e César,
não se completaram.

Purpurinas flamejantes faziam com que seus contornos fossem destinos contagiantes.
Marília dançava com elegância.
Tinha virtudes e olhos de saudade.
César não era homem para Marília,
E ela não era por vez o sol de César.





--------------------
Nota da autora:.."Luciano Ronaldo Sílvia Marília.."esse trecho do conto é a chave para o entendimento do mesmo.Pra quem não compreendeu,é só ler de novo e ver que Luciano,Ronaldo,Sílvia e Marília são a mesma pessoa em estágios diferentes da vida dentro do mesmo texto.